25 de setembro de 2017

[TEXTO] de sonhos e medos


Acabou o sonho?

Acabou o sonho, e talvez tenha acabado muito tarde, porque se os meus sonhos tivessem sido sonhados mais cedo, talvez eu tivesse realizado alguns deles. Mas o fato é que atualmente todos os meus sonhos estão relacionados com ter dinheiro para realizá-los, ir morar nos Pirineus, na divisa entre Catalunha, Andorra e França é um deles. Mas nos meus sonhos, eu teria uma casa boa, confortável, um bom carro, que eu pudesse estar sempre viajando para as cidades vizinhas e curtindo bons restaurantes e bons passeios e curtindo minha terceira idade já próxima. Tenho sonho de preparar eu mesmo todo dia a minha comida. Tenho sonho de viajar 2 ou 3x por ano. Tenho sonho de produzir mais trabalhos pessoais por prazer. Tenho sonho de criar uma revista. Tenho sonho de aprender idiomas, de voltar a estudar música, entre tantos outros.. Coisas que eu não tenho e não consegui nos meus 50 anos aqui no Brasil, então, como não me sobra dinheiro nem para a realidade do cotidiano, imaginem para sonhos irrealizáveis.. melhor é parar de sonhar e colocar os dois pés bem fincados na assustadora realidade.

Mas porque eu sonho em sair do Rio, do Brasil, se aqui o clima é favorável, se temos lugares paradisíacos o ano inteiro, e tudo mais que fazem os turistas se encantarem com o nosso país? Bem, alguns problemas que quase nenhum turista vê. Viver. Simples assim. Aqui é complicado viver. Eu acho que em toda grande cidade, com muitos milhões ou centenas de milhares de pessoas convivendo no mesmo espaço e sendo obrigadas a ceder suas liberdades para máfias de todos os tipos, em todos os setores, é complicado viver, não só no Brasil, mas aqui principalmente. O medo de morrer ou ser assaltado, levar um tiro e ficar inválido, ficar doente e não poder ser atendido, é uma constante em todas as nossas horas do dia e da noite, vemos isso todos os dias em abundância nas mídias e parece que estamos aguardando a nossa vez. Nossa cidade está em guerra há muito tempo, uma guerra fria, que agora está cada dia mais quente.

Eu sempre lembro aquela cena clássica do filme "O Terminal" quando o personagem Viktor Navorski, interpretado por Tom Hanks, está na sala do diretor do aeroporto de NY, sem permissão para entrar na cidade, pois o país de origem dele havia entrado em guerra e estava com relações diplomáticas cortadas com os Estados Unidos, então o diretor arruma uma brecha na lei, onde se ele pedisse abrigo político, por estar com medo da guerra, ele poderia ter um visto temporário e entrar em NY. E aí tem a pergunta clássica: "Viktor, você está com medo do seu país?" e ele responde "Não. Não tenho medo da minha casa, tenho medo dessa sala aqui." É engraçado, mas a minha situação é exatamente inversa, tenho medo sim da minha casa, da minha cidade, do meu estado e do meu país. Da ponta mais extrema de Roraima até a divisa do Rio Grande do Sul com o Uruguay, se mata, se passa fome, se é roubado, se vive em miséria e insegurança. A turista inglesa foi assassinada brutalmente as margens do rio Amazonas, ou seja, não é um problema de metrópole e sim de um país inteiro, cidade ou interior. Um país dilapidado, destruído pelo Governo corrupto, destruído por falta de investimento em educação da sua população, falta de investimento para geração de empregos e aumento da qualidade de vida, destruído pela falta de toda infra-estrutura que um povo necessita para viver com dignidade. Dignidade essa que falta a toda classe que detêm algum poder no país, e não só a classe política, mas empresários, juízes, polícia, funcionários públicos e privados. Praticamente todo mundo que lida com o dinheiro público se vende fácil para obter vantagem pessoal. É o país da farra da corrupção! Os últimos anos ainda foram piores. Um verdadeiro complô para desmoronar e desmontar a estrutura que fazia o nosso país se desenvolver. Nem vou citar mais porque os jornais estão recheados de casos e mais casos todos os dias. É frustrante, é desesperador, e mais que tudo, dá medo, muito medo, muito mais do que se o país estivesse em guerra.

Sonhar numa situação dessas passa a ser realmente uma maneira de aguentar a triste realidade, e enquanto ainda estamos vivos e com capacidade para sonhar, essa pode ser a maneira de se dopar para sobreviver. O problema é que quando estamos dormindo acordados, cada dia somos mais roubados e mortos como seres humanos. Somos as pragas de nós mesmos. Estamos nos exterminando aos poucos.

Que as futuras gerações consigam uma forma de contornar isso, porque nós e nossos filhos e netos, só sonhando mesmo.

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